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Georges Bernanos, o católico fulminante!

Georges Bernanos, quem ousa não louvá-lo? Quem ousa, é porque precisa aprender a lê-lo.

O escritor francês – autor dos tão pungentes Sob o Sol de Satã e Diário de um pároco de aldeia – tem como suas palavras-chave: cristianismo, bem e mal, batalha espiritual, pessimismo, falta de esperança.

Nasceu na Paris de 1888. Cresceu em Fressin, comuna de Pas-de-Calais, região que acabou servindo também de cenário para seus romances.

Sua família: de um lado o pai, Émile Bernanos, estofador e decorador; do outro, sua mãe, Hermance Moreau, de família de camponeses, produtores de frutas silvestres.

Georges Bernanos foi também jornalista. Teve uma vida política intensa, servindo como soldado de trincheira na Primeira Guerra Mundial, e em serviço, como repórter, cobriu a Guerra Civil Espanhola.

Monarquista convicto, participou quando jovem do Ação Francesa, movimento político monarquista de extrema-direita, embora tenha sido expulso por dizer que não suportava tamanho conservadorismo de seus companheiros.

Ou melhor, colegas. Companheiro é termo tão de esquerda, algo que Bernanos não foi, ainda que criticasse seus pares. Após a guerra, deixou de militar, rompeu com a Ação Francesa, mas voltou durante a condenação romana de 1926. Neste mesmo tempo, colaborou no Le Figaro.

Mais do que conservador, entretanto, Georges Bernanos foi católico romano. Católico fulminante!

Em 1926, aos 38 anos, publicou o livro que o consagrou: Sous le soleil de Satan. O nosso Sob o Sol de Satã!

Georges Bernanos
Sob o Sol de Satã, de Georges Bernanos.

Foi o primeiro romance místico inspirado no pároco de Ars – São João Maria Vianney, o Santo Cura d’Ars, padroeiro dos párocos. O homem que desejava a solidão e se sentia incapaz para servir a Deus.

Este é um livro “nascido da guerra”, como Bernanos chegou a dizer. Começou a escrevê-lo durante estadia em Bar-le-Duc, povoado no nordeste da França, isso em 1920.

Época de tormento dentro e fora de Bernanos, sente-se doente, duvida da vontade de continuar vivendo, embora tenha claro que não deseja “morrer sem testemunhar”. Um homem visceral, colérico.

Quando Sob o Sol de Satã vira filme, nas mãos de Maurice Pialat, ganha a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1987.

Bernanos, o monstro divino, escreveu romances ásperos, indigestos. Queria incomodar a alma. Para exorcizar os próprios demônios. E agora os nossos.

Seus personagens são atormentados, vivem agudos conflitos internos, duvidam da fé. Devemos todos ter medo do poder do mal? Buscar a graça divina todo o tempo? A obra de Georges Bernanos responde.

Sua visão trágica e pessimista do cristianismo marcou seu tempo e sua prosa. É que Bernanos descia fundo na análise do ser humano. Foi, toda a vida, chamado de “o Dostoiévski francês”.

Antes de Sob o sol de Satã viveu vários anos em situação financeira precária, trabalhava como inspetor de seguros, o que mal dava para sustentar a família.

A história de Donissan tocou tão fundo a todos que libertou Bernanos para o ofício de sua vida: escrever, escrever, escrever.

Então, em 1933, a caminho de Avallon para a Suíça, porque um de seus filhos lá morava, foi atropelado em Montbéliard por uma professora aposentada. Uma parte do carro entrou em sua perna, no mesmo lugar onde fora ferido em 1914-18.

Mudou-se para as Ilhas Baleares em 1934, parte por razões financeiras. Lá escreveu Diário de um pároco de aldeia. Com ele, ganha o grande prêmio da Academia Francesa. E então mais um livro foi adaptado para o cinema, desta vez por Robert Bresson.

Georges Bernanos
Diário de um Pároco de Aldeia, de Georges Bernanos.

Praticamente em dez anos escreveu a maior parte de seu legado literário. Quando a guerra civil espanhola começa, parte para Maiorca. No primeiro instante, é solidário ao movimento de Francisco Franco. Basta três meses para ficar chocado com a barbárie, quando se revolta com a cumplicidade do clero espanhol com Franco.

Enquanto ainda morava em Maiorca, escreveu Os Grandes Cemitérios sob a Lua, livro considerado importante testemunho deste momento histórico. Pessoalmente, o livro rende a hostilidade de grande parte da direita nacionalista, principalmente da Ação Francesa, a que pertenceu.

Deixou a Espanha 1937 para voltar à França, mas ficou pouco. Em 1938, envergonhado pela falta de pulso dos políticos franceses contra a Alemanha de Hitler, decidiu exilar-se na América do Sul.

Inicialmente, seus planos visavam se estabelecer no Paraguai, já que desde a infância se imaginava no país. Chegando lá, contudo, percebeu ser o país totalmente diferente do que imaginava.

Foi então que veio ao Brasil. Tinha já 50 anos, era consagrado. Veio com Jeanne Talbert d’Arc, sua esposa. Com ela havia se casado em 1917 e geraram seis filhos.

É sempre fato orgulhosamente mencionado que Jeanne era descendente em linha direta de um irmão de Joana d’Arc. Como Georges Bernanos, foi, acima de tudo, católico romano, é claro que seria fato orgulhosamente mencionado. De Joana faria um romance, Joana, Relapsa e Santa.

Joana, Relapsa e Santa Georges Bernanos
Joana, Relapsa e Santa, de Georges Bernanos.

Em nossas terras, Georges Bernanos morou primeiro em Itaipava, no Rio de Janeiro, e na pequena cidade conquistou o respeito e a admiração dos intelectuais cariocas de seu tempo. Foi amigo de Chateaubriand, escreveu para seus veículos.

Depois de um tempo, partiu para Minas Gerais, onde morou em Juiz de Fora; depois Pirapora, onde terminou mais um de seus livros: Senhor Ouine.

Senhor Ouine, de Georges Bernanos.

A icônica casa, contudo, está em Barbacena. A casa chamada “Cruz das almas”! Ela fica numa colina. Propriedade de 450 mil m². Católico fulminante! Escolhera justamente essa por ter esse nome. O francês alto, de olhos azuis, olhar incisivo, gostava de andar a cavalo e de umas doses de pinga.

Hoje, esta casa é o Museu Georges Bernanos. Lá estão os seus livros, sua máquina de escrever, fotografias de uma vida e documentos. Como se não bastasse, lá ainda recebeu o escritor e poeta Stefan Zweig, pouco antes do suicídio…

Bernanos viveu entre a riqueza natural dos mineiros e quis ser fazendeiro com grande criação de gado, assim como instaurar colônia francesa naquelas terras abençoadas. Nas Minas Gerais de seu tempo, tão católica romana.

Só que Charles de Gaulle, quem admirava, o chamou de volta à França. Queria torná-lo acadêmico? Ministro? Bernanos sabia ser revoltado com a mediocridade. Recusou a Legião de Honra e a Academia Francesa.

No Brasil construiu parte de sua obra. Foram sete anos! Podemos ser nós orgulhosos também? Diante de nossas paisagens escreveu o romance mais surpreendente da literatura francesa: Senhor Ouine.

Voltou à França em 1945.

Viveu até 1948.

Morreu de câncer no fígado.

Diálogos das Carmelitas, considerado o seu testemunho espiritual, virou peça de teatro, depois ópera e ainda um filme.

O manuscrito de A França Contra os Robôs foi entregue por Bernanos no hospital, no fim de sua vida. Ambos foram publicados postumamente.

A França Contra os Robôs, de Georges Bernanos.

Georges Bernanos entendeu a alma pobre, falha e covarde do homem. De várias formas – e de duas formas, em particular – resumiu-nos. Porque somos quase todos Mouchette. E são raros os Donissan.

Georges Bernanos está enterrado no cemitério de Pellevoisin.

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